Quotas Preferenciais: admissão de instrumento próprio das sociedades anônimas nas sociedades limitadas

Matheus Kniss Pereira

Especialista em Direito Empresarial

 

Previstas nos artigos 17 e seguintes, da Lei n. 6.404/1976 (“Lei das S.A.”), as ações preferenciais são amplamente utilizadas pelas sociedades anônimas de capital aberto ou fechado, e se destinam, em resumo, à obtenção de determinados benefícios por seu detentor em detrimento da supressão de determinados direitos que em regra lhe seriam próprios.

 

Segundo a Lei das S.A., as ações preferenciais podem prever a prioridade na distribuição de dividendos fixos ou mínimos e a prioridade no reembolso de capital, com ou sem prêmio, cumulativa ou individualmente. Existem alguns critérios a observar na hipótese de oferta de ações preferenciais no mercado mobiliário, tal qual a bolsa de valores. Admite-se, ainda, a subdivisão das ações preferenciais em diferentes classes, cada uma com seus direitos e suas restrições de acordo com os interesses da companhia e de seus acionistas.

 

A admissão da modalidade preferencial com relação às quotas das sociedades limitadas foi instituída por meio da Instrução Normativa n. 81/2020 (IN n. 81/2020/DREI), editada pelo Departamento de Registro Empresarial e Integração (DREI), e teve origem com a interpretação extensiva do disposto no art. 3º, VIII, da Lei n. 13.874/2019 (“Lei das Liberdades Econômicas”). O tema é objeto do Projeto de Lei n. 6.104/2019, em trâmite perante a Câmara dos Deputados, com algumas regras transicionais que deveriam ser observadas e que ainda não são exigíveis em função do estado de tramitação do projeto.

 

O item 5.3.1 da IN n. 81/2020/DREI estabeleceu a possibilidade de subscrição de quotas de classes distintas, desde que o contrato social disponha sobre a regência supletiva da Lei das S.A. e em observância aos limites e às disposições impostas no referido diploma legal. Por sua vez, o art. 3º, VIII, da Lei das Liberdades Econômicas, garante que os negócios jurídicos empresariais paritários sejam objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública.

 

É importante destacar que serão aplicadas subsidiariamente as normas das sociedades simples caso o contrato social não disponha expressamente sobre a regência supletiva pela Lei das S.A. Portanto, a subscrição de quotas de diferentes classes depende de disposição contratual específica versando sobre o tema.

 

Com a absorção de instrumentos próprios das sociedades anônimas pelas sociedades limitadas, alguns cenários, especialmente envolvendo o exercício de atividades empresariais, acabam também se descortinando e tornando viável a utilização desse modelo societário em específico. Como exemplo, o chamado plano de opção de compra de ações ou stock option, destinado à alienação de partes do capital social da companhia a empregados ou colaboradores ocupantes de cargos considerados estratégicos, torna-se uma realidade nas sociedades limitadas.

 

A quota preferencial poderá obstar o direito ao voto, de modo que o quotista preferencial não tenha a possibilidade de participar das deliberações sociais. Todavia, como já mencionado, algum benefício lhe deve ser garantido, e esse benefício se vincula com o direito prioritário na percepção de lucros e dividendos a serem distribuídos pela sociedade comumente.

 

A questão envolvendo as quotas preferenciais tem relação direta com uma vedação expressa constante do Código Civil. Ao contrário das sociedades simples, as sociedades limitadas não admitem o chamado sócio de serviço, que contribui com a prestação de serviços para a formação do capital social (art. 1.055, §2º, do Código Civil). A proibição instituída pela lei civil, porém, não deve ser confundida com a contribuição dada pelo sócio detentor de quotas preferenciais; as quotas de serviço, de plena aplicabilidade, por exemplo, nas sociedades simples, não são idênticas às quotas preferenciais.

 

As quotas preferenciais, assim, asseguram algumas vantagens no planejamento societário e empresarial.

 

Uma delas é absorver como sócio quem tem a contribuir com a sociedade, com o seu crescimento e com o seu desenvolvimento.

 

Ainda, pode-se assegurar que esse alguém admitido não detenha poderes de gestão ou que não influencie na tomada de decisões e nas deliberações sociais.

 

Adicionalmente, possibilita-se que a remuneração do sócio preferencial seja parcialmente adimplida por meio de distribuição de lucros e dividendos que, por ora e enquanto não aprovada a Reforma Tributária, não se sujeitam à tributação pelo imposto de renda.

 

Por fim, a criação de um plano de opção de compra pode, mediante a fixação de determinados critérios, garantir que o quotista preferencial se torne quotista ordinário no futuro.

 

As Juntas Comerciais têm admitido amplamente a criação e utilização das quotas preferenciais nas sociedades limitadas, desde que regidas supletivamente pela Lei das S.A. Há que se observar, porém, critérios técnicos para a elaboração de instrumentos societários destinados a inaugurar esse modelo.

 

O escritório BASDA é especialista na estruturação de negócios e modelos societários, e detém a expertise necessária para a implementação de um projeto que contemple a recente ferramenta posta à disposição dos empresários.

 

Leave Comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *