A Responsabilização do Administrador de Companhia S.A. Pelas Teorias Subjetivas e Objetivas

Por Karel Assef Sadila

Advogado

 

A forma com a qual é entendido e executado o procedimento de responsabilização do administrador é de suma relevância, pois todo o conteúdo probatório necessário depende disso. Desta forma, a mudança de entendimento pode até alterar o polo que tem a obrigação de produção probatória.

 

Nesse sentido, se fazem necessárias as análises de dois institutos, o da responsabilidade civil subjetiva e o da responsabilidade civil objetiva. Logo, cada um destes institutos tem uma dicotomia interna, que será esmiuçada.

 

A responsabilidade civil objetiva é, por pequena parte da doutrina, defendida como ideal para ações de responsabilização de administradores que descumprem com os deveres legais impostos. O instituto funciona de tal maneira, que não se faz necessária à comprovação de culpa do agente, ou seja, independentemente de ter agido dolosamente ou não, pode o agente responder pelos danos e ter seu patrimônio afetado.

 

A única necessidade comprobatória para a responsabilização do administrador, quanto à responsabilidade civil objetiva, é o nexo de causalidade entre a conduta tomada pelo gestor, e o dano causado à companhia ou a terceiro interessado. Nesse sentido, caso fique demonstrado o nexo causal entre a decisão discricionária do agente, e o dano causado, já resta suficiente para que a ação de responsabilização seja procedente.

 

Esta teoria é utilizada normalmente para responsabilizar agentes que cometeram danos ambientais, bem como para proteger consumidores, ou seja, em casos extremamente específicos.

 

Outra vertente da teoria objetiva é a responsabilidade civil objetiva pura. Neste caso, não seria necessário sequer que comprovasse o nexo de causalidade entre a conduta do gestor e o dano causado, sendo o agente responsável universal por perdas que a companhia viesse a sofrer. Por óbvio, essa teoria não é aplicada.

 

Já a responsabilidade subjetiva se subdivide em responsabilidade civil subjetiva clássica, e responsabilidade civil subjetiva com inversão do ônus da prova. A qual, por grande parte da doutrina, é reconhecida como ideal para aplicação no caso do artigo 158, inciso segundo.

 

A responsabilidade civil subjetiva, de maneira geral, é respaldada por três fundamentos. A conduta do administrador, que deve ser tomada por ação ou omissão voluntária, o nexo de causalidade entre o dano causado e a ação ilícita do agente e, por fim, a comprovação de que o dano e a extensão dele são oriundos do mesmo fato

 

É importante também, esclarecer que, para que exista a possibilidade de responsabilização do administrador, neste caso, a conduta deve ter sido tomada por livre e espontânea vontade. Do contrário, caso exista algum tipo de caso fortuito ou força maior, no momento da conduta, fica o administrador isento de qualquer tipo de responsabilidade. Pois, nessa situação, o causador do dano não é o agente, mas sim o caso fortuito ou força maior, que obrigou o administrador a agir daquela maneira.

 

Nesta mesma linha de raciocínio, há de ser salientado que para poder existir a possibilidade de responsabilização do agente, deve haver culpa. Ou seja, a conduta ilícita deve ser oriunda ao menos de uma imperícia, imprudência ou negligência do agente.

 

Nesse sentido, nos casos de culpa concorrente, quando a sociedade ou terceiros tiverem parcial influência no fato gerador do prejuízo, o administrador deve responder apenas quanto à gravidade da culpa, no limite de sua conduta.

 

A forma como este instituto foi redigido pelo legislador brasileiro, fez com que a doutrina se dividisse quanto ao entendimento de qual seria a forma de responsabilização do administrador, quando este for imputado como causador de prejuízos à companhia, por violação da lei ou do estatuto.

 

Desta forma, a maior parte da doutrina brasileira segue o entendimento português, e imputa que a responsabilização do agente deve ser procedida com uma pressuposição de culpa, ou seja, atribui à responsabilidade de antemão, em caso de uma conduta do administrador conter nexo de causalidade com um fato danoso à sociedade. Com isso, teria este agente, de forma presumida, agido com culpa.

 

Esta presunção de culpa, originada de uma decisão desacertada do administrador, em face da companhia, acarreta na inversão do ônus da prova. Que desta forma, obriga o administrador a demonstrar que agiu de maneira proba, ao contrário dos padrões gerais do Código de Processo Civil.

 

Independentemente disso, a simples prova indiciária basta para que seja possível instaurar a ação de responsabilização do administrador. Necessitando apenas que o agente que deseja imputar responsabilidade ao gestor, demonstre indícios de que a conduta ou omissão tenha causado danos à sociedade.

 

Assim, cabe ao administrador demonstrar que agiu de maneira adequada, para que só então sejam requeridos quesitos probatórios por parte do autor das acusações.

 

Portanto, conclui-se que qualquer ato do administrador que, de alguma maneira ao menos suscite dúvidas sobre a devida e absoluta legalidade do feito praticado, já seria passível de análise em ação de responsabilização. Há de ser salientado, também, que a legalidade dita, refere-se à hard law, assim como à soft law, seja esta regulamentação estatutária ou contratual.

 

Por fim, vale enfatizar, caso uma das condutas desrespeitosas citadas, esteja evidente, ou meramente aparente, cabe ao agente demandado, demonstrar que sequer agiu com culpa, e que os prejuízos são oriundos do natural risco da atividade empresarial. Segundo o entendimento majoritário, apenas assim, o administrador fica isento de qualquer tipo de ação que busque sua responsabilização.

 

Entretanto, em contraponto à doutrina dominante, existe o entendimento de que o processo de responsabilização do administrador deve seguir o rito da responsabilização civil subjetiva clássica.

 

Este instituto define que caso existam dúvidas sobre a legalidade dos atos de um administrador, deve o demandante da ação de responsabilização ser encarregado do ônus probatório. Sobre esta ótica, o administrador não fica responsável por provar a legitimidade de seus atos, haja vista que, neste caso, não existe qualquer pressuposição de culpa.

 

A fundamentação para a utilização da responsabilidade civil subjetiva do tipo clássica é defendida por pequena parte da doutrina, entretanto, deve ser analisada de maneira ampla. Primeiramente, há de ser vislumbrado que a normativa civil pátria adota este entendimento como regra geral para agentes que geraram algum tipo de dano, conforme análise do artigo 927 do Código Civil (CC). Assim, apontam os defensores desta teoria, que se faz necessária regulamentação específica, que aponte de maneira objetiva, outra forma de responsabilização de administradores, para que os demandantes possam buscar o ressarcimento de danos, sem que demonstrem o conteúdo probatório adequado.

 

Um dos conhecidos nomes que defendem esta tese alternativa, é o de Fábio Ulhoa Coelho. A demonstração do autor, sobre a tese, é bastante interessante, entretanto, a fundamentação utilizada é contradita por diversos autores que presam pela utilização da inversão do ônus da prova.

 

Segundo Fábio Ulhoa Coelho, toda ofensa à lei ou ao estatuto, que pode ser alvo de responsabilização, é oriunda de uma conduta culposa ou dolosa do administrador, pois as hipóteses dos incisos I e II, do artigo 158, da LSA, são interdefiníveis entre si. Isto é, no entendimento do autor, um inciso completa o outro, ao mesmo passo que não é possível vislumbrar uma situação em que seja desrespeitado um dos incisos e o outro não. Desta forma, o defensor da tese acredita que ambos os incisos devam ser analisados de maneira idêntica e simultânea, impossibilitando qualquer forma de analise separada.

 

Mesmo com a fundamentação dos defensores da tese não sendo totalmente conclusiva, é indispensável enfatizar, neste ponto, a grande diferenciação que existe no entendimento da norma brasileira, comparada aos grandes polos do Direito Societário. Como exemplo, a legislação norte-americana, que as avessas da brasileira, têm uma regulamentação que presume a atitude de boa-fé do administrador, ou seja, privilegia a boa-fé subjetiva clássica no que tange as condutas do agente, exigindo então, que os demandantes arquem com o ônus da prova. Desta forma, no regramento americano, cabe aos agentes interessados na responsabilização do administrador, o pesado fardo de provar o desrespeito do gestor.

 

Portanto, em síntese, esta teoria de entendimento minoritário, aponta que para que possa existir a responsabilização do administrador, que agiu com culpa ou dolo, conforme o artigo 158, LSA. Deve o demandante – seja a sociedade, acionista ou terceiro interessado – demonstrar o desrespeito do administrador à normativa legal, contratual ou estatutária. Bem como, o dano causado à sociedade, e o nexo de causalidade dentre estes fatores. Consagrando assim, a responsabilidade civil subjetiva clássica, ao administrador.

 

Por fim, vale salientar que este estudo não tem o intuito de demonstrar opinião sobre qual dos institutos aqui explanados seria o ideal para ser aceito e utilizado na regulação pátria. A análise desta situação é extremamente complexa, e demandaria um artigo inteiro para que fosse possível debater sobre as diversas situações e pontos de vista. Portanto, resta nesse presente momento, a breve visualização dos institutos, o que é necessário e suficiente para que seja possível analisar o tema direto deste trabalho. Assim, respeitando o entendimento majoritário sobre tema, no Brasil.

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