A NÃO INCIDÊNCIA DO IOF-CÂMBIO SOBRE RECEITAS DE EXPORTAÇÃO: ILEGALIDADE DA SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 246/2018

 

Por Maxwell Lima Dias, Advogado do escritório Berehulka & Agostini Sociedade de Advogados (BASDA), especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Estado do Paraná – PUCPR, e membro da OAB/PR desde 2016.

 

 

O Imposto sobre Operações Financeiras – IOF, cuja competência para sua exigência é da União Federal, possui fundamento constitucional no art. 153, V, do Texto Maior. Para além da previsão constitucional, o IOF é regulado, ainda, pela Lei nº 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional – CTN), que estabelece as normas gerais relativas ao imposto, na Lei nº 8.894, de 1994, e no Decreto nº 6.308, de 2007, que o regulamenta.

 

Dentre as diferentes hipóteses de incidência do IOF, previstas no art. 63, do Código Tributário Nacional, destaca-se a hipótese relativa às operações de câmbio (CTN, art. 63, II):

 

Art. 63. O imposto, de competência da União, sobre operações de crédito, câmbio e seguro, e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários tem como fato gerador:

(…)

II – quanto às operações de câmbio, a sua efetivação pela entrega de moeda nacional ou estrangeira, ou de documento que a represente, ou sua colocação à disposição do interessado em montante equivalente à moeda estrangeira ou nacional entregue ou posta à disposição por este;

 

Neste mesmo sentido, o Decreto nº 6.306/2007, que regulamenta o imposto, em seu art. 11, descreve, assim, a hipótese de incidência relativa às operações de câmbio:           

 

Art. 11. O fato gerador do IOF é a entrega de moeda nacional ou estrangeira, ou de documento que a represente, ou sua colocação à disposição do interessado, em montante equivalente à moeda estrangeira ou nacional entregue ou posta à disposição por este (Lei nº 5.172, de 1966, art. 63, inciso II).

 

Parágrafo único. Ocorre o fato gerador e torna-se devido o IOF no ato da liquidação da operação de câmbio.

 

Considera-se, pois, realizada a hipótese de incidência do IOF-Câmbio com efetivação da liquidação da operação de câmbio, que se verifica pela entrega de moeda estrangeira ao banco autorizado, que, por sua vez, efetua o pagamento do valor equivalente em moeda nacional à taxa de cambio acertada na data do seu fechamento.

 

Com o objetivo de beneficiar os exportadores e oferecer a estes uma maior proteção cambial, permitindo-os honrar seus compromissos no exterior com moeda estrangeira e também optar pelo melhor momento para o ingresso das receitas de exportação no País, a Lei nº 11.371/061, em seu art. 1º, e a Circular BACEN nº 3.691/13, em seu art. 90, permitem que os recursos em moeda estrangeira relativos aos recebimentos de exportações brasileiras de mercadorias e de serviços para o exterior, realizadas por pessoas físicas ou jurídicas, possam ser mantidos em instituição financeira no exterior, observados os limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional.

 

Ainda, em benefício aos exportadores, o Decreto nº 6.306/07, em seu art. 15-B, I, passou a estabelecer “alíquota zero” nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços:

 

Art. 15-B. A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento, observadas as seguintes exceções:

 

I – nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços: zero;

 

Não obstante a clareza e a inequívoca finalidade da norma, em 11 de dezembro de 2018, a Receita Federal do Brasil, por meio da Solução de Consulta Cosit nº 246, passou a entender que, nos termos do art. 63, II, do Código Tributário Nacional, e do art. 11 do Decreto nº 6.306/2007, (i) enquanto forem mantidos os recursos em moeda estrangeira em Instituição Financeira fora do país, não haverá a incidência do IOF-Câmbio, em virtude de não ter sido realizado o fato gerador do imposto, por falta de liquidação dos valores; (ii) Em caso de ingresso destas receitas de exportação de bens e serviços no país, as operações de câmbio serão tributadas pelo IOF-Câmbio à alíquota zero; (iii) No entanto, caso estas receitas decorrentes de exportação de mercadorias e serviços para o exterior, inicialmente mantidas em conta no exterior, forem, em data posterior à conclusão do processo de exportação, remetidas ao Brasil, sofrerá a incidência do IOF à alíquota de 0,38% (trinta e oito décimos por cento).

 

Ainda, de acordo com o novo entendimento exarado pela Receita Federal do Brasil, as remessas de exportação somente farão jus à alíquota zero do IOF-Câmbio, se remetidas ao Brasil no mesmo dia em que recebidas na conta no exterior de titularidade do exportar, o que se sequer deve ser possível em termos procedimentais, tendo em vista a burocracia exigida para remessa de valores mantidos no exterior para o Brasil.

 

Assim, na (equivocada) interpretação do Fisco, o processo de exportação encerra-se com o recebimento dos recursos em conta mantida no exterior. Por isso, se em data posterior ao depósito o exportador decide remeter os recursos ao Brasil, tem sido compelido ilegalmente a pagar o IOF.

 

Trata-se, no entanto, de entendimento manifestamente ilegal, uma vez que é evidente a sua contradição em face da expressa determinação legal prevista no art. 15-B, I do Decreto nº 6.306/07, que é claro ao dispor que as receitas de exportação de bens e serviços fazem jus à alíquota zero do IOF-Câmbio.

 

Tal conduta exarada pela Receita Federal do Brasil viola o Princípio da Legalidade, insculpido nos arts. 5º, II, 150, I, da CF/88 e art. 97 do CTN, ao pretender impor limites não previstos em lei ao direito do contribuinte. Isto porque não há na lei tributária, qualquer dispositivo que estipule um prazo para manutenção da receita de exportação no exterior. E para ser criado um novo aspecto temporal à cobrança do IOF-Câmbio, somente Lei Complementar poderá fazê-lo.

 

Ademais, a partir desta interpretação, estaria a autoridade fazendária alterando o conteúdo e o alcance de conceito de receitas decorrentes de exportação, a que se refere a Constituição Federal, o que, sabidamente, é vedado pelo art. 110 do Código Tributário Nacional, in verbis:

 

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

 

Os bancos já estão seguindo o entendimento da Receita, haja vista serem os responsáveis legais pela retenção automática do imposto, e podem ser cobrados, pessoalmente, caso o IOF não seja recolhido. O percentual é significativo, principalmente para companhias que são majoritariamente exportadoras.

 

Diante de tamanha ilegalidade, os Tribunais Pátrios já estão sendo demandados pelos contribuintes exportadores acerca destas exigências abusivas, tendo sido, inclusive, concedidas liminares para suspensão da exigência do IOF-Câmbio sobre o ingresso de Receita de Exportação inicialmente mantida no exterior.

 

Conclui-se, dessa forma, que, por se tratar de exação manifestamente ilegal por parte da autoridade fazendária, o contribuinte deverá buscar judicialmente a garantia de seus direitos, de modo a afastar a exigência de IOF-Câmbio sobre o ingresso de valores no país decorrentes de exportação, independentemente do tempo em que permaneceram depositados em conta no exterior.

 

Para mais informações, acesse: http://basda.blog.br/.

 

Curitiba, 09 de abril de 2019.

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