A Business Judgment Rule e seus Aspectos

Por Karel Assef Sadila

Advogado

 

A Business Judgment Rule (BJR) é um instituto jurídico que prevê a possibilidade de afastamento da responsabilidade civil de determinado agente de companhia de capital aberto, que seguir os preceitos de lealdade e diligência, porém agiu de maneira que causou danos à companhia.

 

A BJR se desenvolveu na jurisprudência norte-americana. Primordialmente, surgiu como uma exigência negativa para que existisse a possibilidade de responsabilização do administrador. Assim, deveria o agente, comprovadamente, ter tido uma conduta não esperada, de maneira que ensejasse em prejuízo à companhia.

 

Com o decorrer do tempo e a continuidade da aplicação da BJR, outros aspectos foram sendo implementados ao entendimento. Com isso, foram surgindo alguns elementos de maneira mais explícita, como o interesse da companhia, a fraude e a boa-fé.

 

Por fim, a jurisprudência americana construiu o entendimento de que, caso o administrador da companhia tenha atuado com absoluta boa-fé, de maneira informada, independente e desinteressada, visando o bom andamento da sociedade empresarial a qual ele administra, e mesmo assim sua conduta causar prejuízos à sociedade, não há no que se falar em responsabilização, por força da denominada BJR.

 

Independentemente da possibilidade de compreensão da BJR por seus julgados, a tarefa de realizar uma definição ao instituto não é nada simples. Em contrapartida a doutrina brasileira, os juristas norte-americanos são bastante rasos quantos a definições.

 

De qualquer forma, se podem extrair alguns entendimentos de julgados, situação essa que nos proporciona algo muito similar a uma definição propriamente dita.

 

Neste caso, a BJR foi compreendida inicialmente como um pressuposto de que, no momento em que um administrador de uma companhia vai definir sua conduta, mesmo que omissiva, faz isso de maneira absolutamente informada, de boa-fé e com o entendimento de que a tomada de decisão é a melhor para os objetivos da companhia. Com esses fatores, bem como contemplada a ideia de que não houve abuso de poder de nenhuma das partes interessadas, fica obrigado o órgão julgador, a respeitar a decisão tomada pelos administradores da companhia, mesmo que tal conduta tenha causado prejuízo à sociedade empresarial e seus acionistas, sem a possibilidade de repatriação dos prejuízos em processo de responsabilização dos agentes envolvidos.

 

Isso quer dizer, a corte julgadora fica impedida de alterar a decisão administrativa, ou seja, impera a decisão tomada pelos administradores, a não ser que comprovado algum atentado aos deveres fiduciários, que os administradores são submetidos.

 

Em conjunto a isso, para Guilherme Nadalin, a BJR pode ser compreendida concomitantemente como um padrão judicial de conduta e um padrão de responsabilização dos administradores. Para o autor, os padrões de revisão e responsabilização demonstram como a corte deve verificar se o administrador deve ser responsabilizado ou não, ao rever sua conduta.

 

De qualquer maneira, esses institutos não podem ser confundidos com o padrão de conduta do administrador, que faz referência aos deveres fiduciários deste agente para com a companhia.

 

Isto é, se no cumprimento de suas atribuições, um administrador atuar de maneira proba, qualificada e definitivamente em concordância com os deveres fiduciários, independentemente dos resultados da conduta, a decisão está protegida, bem como os administradores e a própria companhia estarão afastados de quaisquer responsabilizações, por força da BJR.

 

No que tange a tentativa de definição da BJR, inicialmente houve o entendimento de que a BJR seria um pressuposto, e que em sua consequência existiria a inversão do ônus probatório. Com isso, caberia ao requerente da responsabilização demonstrar que o agente agiu em contrariedade aos requisitos da BJR.

 

Por outro lado, os entendimentos mais modernos sobre o assunto apontam que, é imprescindível que fique claro que a regra da BJR não surge como pressuposto, sendo este pressuposto, efeito da sua aplicação.

 

Isso significa que a BJR não é uma pressuposição, o ônus probatório não é invertido, cabe ao administrador demonstrar que agiu de maneira respeitosa aos deveres a ele incumbidos. Ou seja, para poder se valer dos efeitos da BJR, deve o administrador comprovar que possui seus pré-requisitos.

 

Nesse sentido, Lyman Johnson explica a importante diferença entre o dever de diligência, que é padrão de conduta, para a BJR, a qual é padrão de responsabilização. Segundo o autor americano, por mais que os institutos se complementem e em determinado momento sejam analisados de maneira una, são absolutamente distintos e servem a propósitos diversos.

 

O dever de diligência tem o objetivo de linear às condutas do administrador, ou seja, determinar como o agente deve agir para efetuar suas condutas de maneira segura a todos os interessados. Já a BJR é uma política de não interferência do poder judiciário, ou seja, uma forma de proteger o administrador, sob a comprovação de que não prejudicou a companhia de maneira proposital, bem como que tenha agido como o esperado.

 

Isto demonstra o fato ilustrado anteriormente, a BJR não é uma pressuposição, pressuposto é apenas seu efeito. A BJR nada mais é do que uma política de não interferência judicial.

 

Por conseguinte, é indispensável explanar os elementos normativos necessários para a possível caracterização da BJR. Segundo Paulo Câmara, a atuação do administrador deve primordialmente ser informada, livre de interesses pessoais e orientada por critérios de racionalidade empresarial.

 

Assim, para que seja possível o emprego da norma, deve o administrador cumprir os três requisitos, indispensavelmente. O primeiro requisito é a exigência de que a conduta tenha sido tomada de maneira sabida, conhecendo todas as informações necessárias para que fosse possível uma tomada de decisão coesa e coerente. Isso, desde que a informação necessária seja razoável, ou seja, esteja ao alcance do agente, no caso concreto.

 

O segundo requisito é o qual impõe que o administrador não se utilize da posição a qual postula para se posicionar em prol de interesses desconectados a sociedade empresarial a qual ele representa. A inexistência de interesse pessoal na decisão, nesse sentido, exige que o administrador seja leal para com a sociedade a qual ele presta serviços, no momento em que realiza a tomada de decisão.

 

Por fim, a terceira exigência é de que o administrador da companhia, no momento em que toma sua conduta, faça isso se utilizando da absoluta racionalidade empresarial, exigência a qual com certeza apresenta maior grau de complexidade. Este requisito traz um conteúdo subjetivo, o qual exige para a possibilidade de aplicação da BJR, a tomada de decisão racional. Isto quer dizer, requer que o administrador atue de maneira profissional e proba, coerentemente com o que é esperado pelos investidores.

 

Por óbvio, o objetivo da regra não é impedir a aparição da BJR, logo, não se refere aos simples prejuízos que podem ser originados por uma tomada de decisão ruim, exigindo, no entanto, que o agente não atue de maneira descompromissada.

 

Desta forma, ao realizar a análise dos requisitos, fica clarividente que as exigências são consubstanciadas nos deveres fiduciários. De qualquer forma, independentemente da semelhança entre os institutos, há de ser reiterado que as normas não se confundem.

 

Isto quer dizer que, é evidente que os institutos aparentemente sejam intrínsecos, num sentido teleológico, ambos buscando valorizar a boa-fé do dedicado administrador. No entanto, são examinados separadamente, para que só então, com a devida comprovação da boa-fé da conduta do agente, num sentido subjetivo e objetivo, apenas assim possa ser aplicada a BJR, com plenos efeitos, impossibilitando o poder judiciário de interferir no mercado e responsabilizar o administrador, caso tenha agido integralmente da maneira adequada.

 

 

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