Por Maxwell Lima Dias, Advogado e Compliance Officer no escritório Berehulka & Agostini Sociedade de Advogados (BASDA), especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Estado do Paraná – PUCPR, e membro da Comissão de Precatórios da OAB/PR
- INTRODUÇÃO
Desde os debates sobre a Reforma da Previdência, sobretudo após a aprovação das novas regras da aposentadoria, o setor da previdência privada vivenciou um alto impulsionamento no mercado de capitais, havendo um aumento considerável da procura pelos investidores por seus produtos, como o VGBL e o PGBL.
Além disso, dentre os instrumentos que pautam a elaboração de planejamentos sucessórios, os planos de previdência privada são um aliado importantíssimo, mormente quando trabalhamos com valores financeiros detidos pelo grupo familiar. Os planos de previdência, principalmente os VGBLs, e referente a questão de sucessão, têm vantagens se comparados a manutenção de ativos em outros investimentos financeiros, uma vez que diferentemente de outros investimentos, os planos de previdência são transmitidos diretamente aos beneficiários, não necessitando do procedimento de inventário. Isso gera, inclusive, aos herdeiros o benefício da liquidez financeira imediata, o que poderá auxilia-los para concluir e arcar com os demais custos do processo de inventário.
Outro fator vantajoso para quem decide investir nos Planos VGBL, está na não incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD, no momento da transmissão destes valores aos beneficiários do plano contratado. Acontece que, nem todos pensam dessa forma. Ou melhor, nem todo Estado – lembrando que o ITCMD é um tributo cuja instituição e exação é de competência dos Entes Federativos, inclusive Distrito Federal – possui este entendimento. É o caso do Paraná.
Já em 2011, através do parecer emitido pela Procuradora Fabiana Yamaoka Frare, a Procuradoria Geral do Estado do Paraná, baseada na premissa de que os Planos VGBL possibilitam ao contratante o resgate dos valores investidos, exarou o entendimento de que o recebimento destes valores pelos beneficiários indicados no plano contratado estaria sujeito ã incidência do ITCMD.
- NATUREZA JURÍDICA DO VGBL E NÃO SUJEIÇÃO AO ITCMD
A incontrovérsia entre aqueles que entendem que incide o imposto sobre o recebimento dos valores investidos nos Planos VGBL e aqueles que entendem pela não incidência, reside na incerteza sobre a natureza jurídica destes planos. Para aqueles primeiros, o VGBL nada mais seria do que uma espécie de “Contrato de Investimento”, tendo em vista que, tanto no VGBL, quanto no PGBL, “há a acumulação de recursos restituíveis, a qualquer momento, ao investidor”.
Já para aqueles que entendem pela não incidência do imposto, posicionamento este ao qual, particularmente, nos filiamos, os planos de previdência VGBL possuem incontestável natureza de seguro de pessoas (podendo o aderente contar com o valor investido em vida ou repassá-lo a seus dependentes em caso de falecimento), razão pela qual são transmitidos diretamente aos beneficiários em caso de morte do titular sem a necessidade de incluir os valores no inventário e, consequentemente, do pagamento do ITCMD, imposto cuja hipótese de incidência é a transferência de bens ou direitos, via doação ou causa mortis.
Com efeito, a legislação brasileira é silente na definição da natureza jurídica dos planos de previdência privada. Não bastando isso, o ITCMD carece de Lei Complementar – espécie normativa de caráter Nacional, cuja aplicabilidade vincula indistintamente a Administração Pública direta e indireta no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e visa prevenir conflitos de competência entre os entes tributantes – que regule e fixe as normas gerais do imposto, nos termos do art. 146 da Constituição Federal.
Em virtude dessa vacância, os Estados, com fulcro no art. 24, § 3º, da Constituição Federal, e do art. 34, § 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (“ADCT”) ficam autorizados a exercerem sua competência plena para editar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário nacional no exercício da sua competência. Logo, cada Estado possui em sua própria legislação o estabelecimento de normas gerais do imposto, além daquelas que o institui, de modo que o Contribuinte fica refém destas regulamentações gerais de seu respectivo Estado.
Dessa forma, a construção normativa lógico-semântica a respeito da não incidência do ITCMD sobre o recebimento dos valores investidos em VGBL, dependerá da interpretação sistemática do nosso ordenamento jurídico.
Inicialmente, cumpre ressaltar que o art. 110 do Código Tributário Nacional veda à Lei Tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
Por outro lado, o Código Civil determina, em seu art. 794, que no seguro de vida, cuja natureza é atribuível ao VGBL, “o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”.
O VGBL não pode ser interpretado como um mero fundo de investimento, mesmo porque as entidades que operam com a referida previdência privada são controladas e fiscalizadas pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, previdência privada aberta, capitalização e resseguro. A própria SUSEP, em seu site, ao indicar a diferença entre o VGBL e o PGBL, deixa muito claro que o primeiro é “classificado como seguro de pessoa”¹:
“VGBL (Vida Gerador de Benefícios Livres) e PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres) são planos por sobrevivência (de seguro de pessoas e de previdência complementar aberta, respectivamente) que, após um período de acumulação de recursos (período de diferimento), proporcionam aos investidores (segurados e participantes) uma renda mensal – que poderá ser vitalícia ou por período determinado – ou um pagamento único. O primeiro (VGBL) é classificado como seguro de pessoa, enquanto o segundo (PGBL) é um plano de previdência complementar.”
A mesma conclusão é extraída de normas da SUSEP e do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), como, por exemplo, da Circular nº. 564/2017 da SUSEP, cujo artigo 2º expressamente classifica o VGBL como um dos tipos de seguro de pessoas. Vale ainda observar que ao responder a Consulta Tributária nº 79/2012, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo esclareceu que o ITCMD não pode incidir sobre o VGBL justamente em virtude da natureza securitária do plano de previdência privada, na medida em que “os valores constantes de tais planos de previdência complementar estariam excluídos do próprio campo de incidência do ITCMD, por não se submeterem às regras normais de sucessão e herança”².
Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, nos autos do processo nº 0037991-96.2017.8.16.0000, expressamente afastou a pretensão do Estado do Paraná de exigir o imposto com base na Lei nº. 18.573/2015, afirmando que o VGBL possui natureza de seguro de pessoa e, por esse motivo, não está sujeito a tributação do ITCMD.
Assim, ambas as correntes baseiam-se na lacuna da lei para definir a natureza jurídica do ITCMD, para justificar a incidência, ou não, do ITCMD no recebimento dos valores investidos em plano VGBL.
3. CONCLUSÃO
Nós, do escritório BASDA, temos certo em nossos estudos tributários, de que a natureza jurídica do Plano VGBL foge aos contratos de investimento, e por se tratar de seguro de pessoa, a ele se aplica o disposto no art. 794 do Código Civil, excluindo-o, assim, do campo de incidência do ITCMD, no caso do Paraná, nos termos do art. 9º, da Lei nº 18.573/15: “O ITCMD não incide: (…) no recebimento de capital estipulado em seguro de vida ou em pecúlio por morte”.
Em virtude disso, não restam dúvidas de que o Plano de Previdência Privada VGBL, hoje, consiste em uma ótima e segura ferramenta de planejamento patrimonial e sucessório, haja vista que o investimento pode ser transmitido diretamente aos beneficiários, não necessitando do procedimento de inventário, e, consequentemente, não está sujeito à incidência do ITCMD.
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