A LC nº 160/2017 e a Convalidação de Incentivos Fiscais Relativos ao ICMS.

Por Maxwell Lima Dias

Advogado e membro da OAB/PR desde 2016.

                

 

 

 

Introdução

 

O Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS possui um papel fundamental na arrecadação dos Estados e Distrito Federal, e é a materialização do Princípio Federativo, cujo fundamento encontra-se insculpido no artigo 1º da Constituição Federal.

 

A ideia do imposto federal com repartição de receitas entre Estados e Distrito Federal não vingou, haja vista não poderem Estados politicamente autônomos dependerem do repasse das verbas da União. Assim, surgiu o imposto estadual conhecido hoje como ICMS.

 

Esta descentralização da competência tributária, no entanto, tem gerado diversos conflitos nas relações interestaduais, uma vez que cada Estado, no exercício de sua competência poderia conceder livremente isenções e benefícios fiscais, acarretando em concorrência desleal para com os demais Estados. É a chamada Guerra Fiscal.

 

A terrível consequência da Guerra Fiscal, e que aflige os Estados mais pobres da Federação, é a redução da oferta de emprego e a diminuição da movimentação de capital no território. Os Estados menos favorecidos acabam perdendo empresas instaladas em seu território para os Estados mais ricos, que podem abrir mão de parcela da receita e concedem substanciais incentivos e isenções.

 

Em razão disso, foi criada a Lei Complementar nº 24/1975, tendo sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988, cumprindo a determinação do artigo 155, §2º, XII, ‘g’, do Texto Maior.

 

Lei Complementar nº 24/75 – CONFAZ

 

Esta Lei Geral veio para regular a forma de como seriam concedidas e revogadas as isenções e benefícios fiscais, mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal. Conforme estabelece o artigo 2º, §2º, da LC 24/75, a concessão de incentivos fiscais por um ou mais estados dependerá da deliberação unânime de todos os Estados e Distrito Federal:

 

Art. 2º – Os convênios a que alude o art. 1º, serão celebrados em reuniões para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo federal.

(…)

  • 2º – A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.

 

O Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ é o órgão colegiado formado pelos Secretários de Fazenda, Finanças ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal, cujas reuniões são presididas pelo Ministro de Estado da Fazenda, competindo-lhe, precipuamente, celebrar convênios para efeito de concessão ou revogação de isenções, incentivos e benefícios fiscais do ICMS.

 

Assim, para que um Estado possa conceder algum incentivo ou benefício fiscal para o contribuinte, precisará de validação pelo CONFAZ. Ou seja, aprovação por unanimidade dos demais Estados e Distrito Federal.

 

Acontece que, apesar desta norma geral de vigência nacional prever a necessidade de validação do benefício fiscal pelo CONFAZ, esta regra não tem sido cumprida pelos Estados, que vêm concedendo unilateralmente isenções e benefícios fiscais aos contribuintes, para atrair investimentos em seu território, sem qualquer autorização do CONFAZ.

 

Dessa forma, não havendo convênio pelo CONFAZ acerca de benefício fiscal concedido por um Estado, estará a lei concessiva do incentivo em contrariedade à Constituição Federal, devendo ser a norma expurgada do ordenamento jurídico. Em relação aos contribuintes do ICMS que não recolheram corretamente o tributo entendendo estar abarcado pelo benefício fiscal (ilícito) serão autuados pelo Fisco.

 

Lei Complementar nº 160/2017 – Fim da Guerra Fiscal?

 

Em 07.08.2017, foi publicada a Lei Complementar nº 160/2017, que convalidou os benefícios e incentivos fiscais de ICMS já concedidos, bem como a possibilidade de os Estados concedê-los e prorrogá-los por até 15 anos, a depender das atividades desenvolvidas pelo contribuinte.

 

Além disso, a referida norma possibilita que os Estados que concederam benefícios e incentivos fiscais à revelia do CONFAZ, poderão remitir os créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais concedidos em desconformidade com o disposto na alínea “g” do inciso XII do § 2o do art. 155 da Constituição Federal.

 

Assim, todas as ações judiciais, inclusive as que tramitam no STF, devem ser encerradas, bem como as lides administrativas em todos os Estados da Federação.

 

Para isso, nos termos do artigo 2º da LC 160/2017, o convênio, que deverá tratar sobre a convalidação dos benefícios e incentivos fiscais concedidos de forma irregular e a remissão dos créditos tributários deles decorrentes, deverá ser aprovado e ratificado com o quórum mínimo de 2/3 das Unidades Federadas, e 1/3 das unidades federadas integrantes de cada uma das cinco regiões do País.

 

Outra novidade relevante trazida pela LC 160/2017, é a previsão de sanções financeiras para os Estados que, no futuro, concederem benefícios fiscais que não estejam respaldados em Convênio. Nos termos do artigo 6o o ente (i) não poderá receber transferências voluntárias, (ii) não poderá obter garantia de outro ente, que viabilize operações de endividamento e, ainda, (iii) ficará proibido de realizar operações de crédito, salvo em hipóteses bastantes específicas, nos termos do artigo 23, parágrafo 3o da Lei de Responsabilidade Fiscal, a LC 101/2000.

 

A LC 160/2017 tem como objetivo pôr fim à Guerra Fiscal, que tem se mostrado tão danosa aos Estados mais pobres da Federação. No entanto, ainda está muito cedo para termos certeza se esta norma porá fim à Guerra Fiscal, isto porque as sanções trazidas pelas normas já existiam em nosso ordenamento jurídico, e não foram suficientes para impedir que os Estados concedessem benefícios e incentivos fiscais sem a deliberação do CONFAZ.

 

No entanto, é seguro afirmar que a LC 160/2017 veio para dar certeza sobre o passado. Todas as empresas que possuíam provisões para lidar com essa incerteza liberarão seus recursos, e aquelas que possuem lides administrativas ou judiciais envolvendo essa matéria, poderão pedir o arquivamento dos autos. Eventuais créditos poderão ser reanalisados, pois pode ocorrer que, em algumas situações especificas, hajam recursos a serem recuperados.

 

Convênio ICMS 190/2017 – CONFAZ

 

Em 15.12.2017 foi publicado o Convênio nº 190/2017, que, nos termos da Lei Complementar nº 160/2017, dispõe sobre a remissão de créditos tributários decorrentes de isenções, benefícios e incentivos fiscais concedidos unilateralmente pelos Estados, instituídos, por legislação estadual ou distrital publicada até 08.08.2017, sem a devida autorização do CONFAZ.

 

Também serão remitidos e anistiados os benefícios, no período de 08.08.2017 até a data da reinstituição, desde que a reinstituição não ultrapasse 28.12.2018, decorrentes de: a) concessão pela unidade federada a contribuinte localizado em seu território, com base em ato normativo vigente em 08.08.2017, observadas suas condições e limites; b) prorrogação pela unidade federada de ato normativo ou concessivo; c) modificação pela unidade federada de ato normativo ou concessivo, para reduzir-lhe o alcance ou montante.

 

Ainda, de acordo com a cláusula nona do referido convênio, ficam autorizados os Estados, até 28.12.2018, a reinstituir os benefícios fiscais, por meio de legislação estadual ou distrital, publicada nos respectivos diários oficiais, decorrentes de atos normativos editados pela respectiva unidade federada, publicados até 08.08.2017, e que ainda se encontrem em vigor.

 

Resta, agora, aos Estados instituírem leis para remitir os créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes de isenções, benefícios e incentivos fiscais concedidos unilateralmente, sem autorização do CONFAZ.

 

Créditos Presumidos Concedidos por Lei Estadual sem Autorização do CONFAZ – Efeitos Práticos

 

Conforme entende o STF, a concessão unilateral por um Estado de créditos presumidos que incorram em redução de alíquota é ilícita, o que acarreta na nulidade do ato concessivo (LC 24/75, art. 8º, I).

 

Assim, restaria ineficaz o crédito presumido concedido pelo Ente Federado à revelia do CONFAZ, ficando o contribuinte impossibilitado de utilizá-lo ou transferi-lo.

 

No entanto, com a entrada em vigor da LC 160/2017 e o Convênio ICMS 190/2017, o contribuinte, a quem a legislação tributária estadual tenha concedido créditos presumidos sem autorização do CONFAZ, poderá agora utilizá-lo para compensar com débitos já constituídos, ou até transferi-los a outros contribuintes, em caso de créditos acumulados.

 

No Estado do Paraná, a transferência de créditos de ICMS por contribuintes que acumulam crédito se dá pelo Sistema de Controle da Transferência e Utilização dos Créditos Acumulados.

 

Agora, contribuintes do Estado do Paraná que acumulam créditos de ICMS, e gozam de crédito presumido não validado pelo CONFAZ, poderão transferir estes créditos, via SISCRED, a outros contribuintes que necessitem destes créditos para compensar com débitos do imposto.

 

Para mais informações, acesse: http://basda.blog.br/.

 

 

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