O Dever de Diligência e Seus Aspectos

Por Karel Assef Sadila

Advogado

 

A Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1976, Lei das Sociedades por Ações (LSA), determina a positivação do dever de diligência. Tal instituto é extremamente importante para o administrador de companhias de capital aberto e fechado, isso pois, podem representar a possibilidade ou não de responsabilização do referido administrador, em caso de insucesso de alguma operação.

 

Para Márcia Andrade Santiago, a exigência normativa é de que o administrador zele pelo interesse da sociedade, agindo de maneira empenhada e criteriosa, tendo a devida cautela e objetivando sempre os interesses da sociedade, resguardando suas condutas dentro das normas legais e da sociedade, da mesma forma que agiria caso estivesse gerindo seu próprio negócio. Para que por fim, este conglomerado de condutas representasse a diligência que deve ser empregada pelo administrador.

 

Para Massimo Bianca, a diligência pode ser entendida como meio, no qual deve ser empregada a atenção, cautela e perícia necessárias para que o fim seja alcançado dentro dos conformes legais.

 

Por outro lado, Modesto Carvalhosa e Nilton Latorraca, enaltecem que o texto legal tem referencias no preceito norte-americano do Standard of Care. Segundo os autores, a maneira como a lei exige que se respeite a diligência, frente à companhia, é inadequada, haja vista que quando a normativa legal se refere ao cuidado e a diligência, no momento em que cita o homem probo, está fazendo referência ao entendimento alienígena de dever de cuidado e estaria abrindo uma subjetivação desinteressante ao modelo de civil law adotado no Brasil.

 

Coutinho de Abreu afirma que de maneira geral, o dever de diligência é compreendido como uma obrigação dos administradores, que deverão empregar para suas contundas de organização, de decisão e de controle societário, o tempo e esforço necessários, requeridos pela necessidade da função e das circunstancias específicas, bem como, deverão empenhar todo o conhecimento e experiência que possibilitaram que o administrador fosse contemplado com sua posição atual.

 

Ao analisar o dever de cuidado, Liliana Rodrigues Diegues Moreira, afirma que o dever de cuidado é interpretado como o despender de tempo, a utilização de toda a capacidade técnica e dos conhecimentos gerais das atividades da sociedade, guiado pelos atos diligentes de um administrador criterioso e organizado.

 

A diligência citada pela autora é compreendida como o empenho ou sacrifício necessário para o cumprimento dos deveres positivados e que fazem frente à sociedade. Portanto, abre-se espaço para uma subjetivação do dever supracitado. Subjetividade esta, que deve ser dirimida com base na causalidade e no caso concreto, levando em consideração todas as particularidades encontradas, avaliando o nível de exigência dos deveres, atentando principalmente aos riscos que a conduta pode gerar, bem como a experiência do administrador que pode utilizar dos meios disponíveis e de seus conhecimentos para contingenciar as decisões. Desta forma, caberia uma observação cooperada para que seja possível realizar a valoração da conduta, seja ela dentro ou fora dos limites diligenciais esperados.

 

Neste mesmo sentido, Mariana Figueiredo, aborda a problemática da subjetivação do dever de diligência. Demonstra preliminarmente que o dever de diligência é imposto como dever geral de atuação do administrador. Assim, este estado de agir diligentemente não se trata de um dever em sentido estrito, mas sim, de critérios psicológicos e normativos que o administrador leva em conta ao realizar comportamentos que contemplam os então, deveres de conduta.

 

Com isso, resta claro que o entendimento do dever de diligência é abrangente e subjetivo. Mesmo sem entrar, por hora, no mérito da responsabilidade civil. É inequívoco que por influência desta subjetivação, o dever de cuidado fica essencialmente coligado com o conteúdo da conduta, ou seja, o dever analisado pode ter certo grau de subjetividade, quanto ao que se refere à atitude tomada pelo administrador. Por conta disso, há de se entender que não se objetiva limitar a atuação, ou então, demonstrar qual caminho o administrador deve traçar, mas sim, tem o intuito de demonstrar como o conteúdo dos comportamentos deve ser procedido.

 

Desta forma, fica claro em que tocante o critério é objetivo. Pois, se por um lado é desinteressante que existam limitações à atuação do administrador, que em tese é o mais qualificado e o competente a tomar as decisões, por outro é objetiva e positivada a forma com que este agente tem de realizar suas condutas. Respeitando, desta vez de maneira objetiva, os deveres e obrigações referentes ao seu cargo.

 

Entretanto, é necessário esclarecer que o dever de diligência é mais complexo e abrangente do que sua normatização dá a entender. Em prima análise, existem subdivisões que buscam deixar a norma menos abstrata, mais completa e aplicável às condutas cotidianas dos agentes.

 

Nesse sentido, Liliana Rodrigues Diegues Moreira, esclarece que é possível analisar diversos subdeveres relacionados ao dever de cuidado, como por exemplo, o dever de disponibilidade, dever o qual exige que o gestor se se faça presente à sociedade, gerindo-a de maneira corrente, despendendo de tempo para tal, não apenas comparecendo esporadicamente ou apenas cumprindo formalidades. Vale salientar que o dever de disponibilidade não exige que o administrador esteja presente nas instalações da companhia, pois é inequívoca a ideia de que quantidade não é sinônimo de qualidade, devendo o agente despender de seu tempo, mas de maneira produtiva e profissional, ou seja, o agente tem que se dedicar de maneira suficiente, sem que seja omisso, o que lhe permite estar ciente do que ocorre na companhia sob sua administração.

 

Nesta mesma linha de raciocínio, o dever de vigilância e o de investigação, são os deveres que impõe que o administrador obtenha todos os dados necessários para ter conhecimentos suficientes sobre o objeto da companhia e o que ocorre nela, de maneira que possibilite que esteja por dentro de tudo que ocorre na companhia, de maneira geral.

 

Logo, é possível enaltecer o dever de executar a atividade com competência técnica, que é conceituado como o subdever que exige que o administrador detenha conhecimentos para atuar na função que lhe foi imposta. É interessante salientar que cabe ao administrador verificar a veracidade das informações prestadas a ele, nesse sentido, caso exista alguma dúvida sobre o que foi informado, este agente deve buscar a mais correta informação sobre o ponto questionado.

 

O dever de preparar adequadamente o processo decisório está atrelado ao dever de vigilância e investigação, pois é imprescindível para seu cumprimento, haja vista que para que exista um processo decisório completo, deve o administrador ter acesso a todas as informações corretas e atualizadas sobre a questão. Desta forma, apenas assim o agente pode ter noção do know-how específico e mínimos níveis informativos para poder alcançar a correta tomada de decisão.

Por fim, também atrelado aos subdeveres mencionados, é necessário analisar o dever de tomar decisões não irracionais. Este dever por sua vez tem conotação negativa, ou seja, o dever de não fazer. Nesse sentido, o objetivo é que o administrador não diminua seu grau de atenção ou de esforço no cumprimento de suas atribuições, tendo como critério para análise, a racionalidade, especificamente. Desta forma, o subdever deve ser entendido como, a variedade de possibilidades, no contexto das arbitrariedades, que possibilitam contemplar a efetividade de decisões irrazoáveis, entretanto não irracionais.

 

Com isso, ficam demonstradas as intenções dos preceitos diligenciais, haja vista que em todos os casos a simples atuação de boa-fé, cumulada com o compromisso necessário no momento das tomadas de decisões por parte do administrador, invariavelmente o fazem estar caminhando dentro das exigências diligenciais.

 

Dessa forma, tendo maiores possiblidades de evitar algum tipo de responsabilização, em casos de insucesso de suas operações frente à companhia na qual administra.

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