Da Colação e do Adiantamento da Legítima

Caroline Zoghbi Polonio

OAB/PR 100.131

 

 

Você já se deparou com as seguintes terminologias: “Colação, Adiantamento de legítima, doação inoficiosa e Sonegação”? A primeira vez que as escutamos é normal soar estranho aos ouvidos, afinal, são palavras que não fazem parte do nosso cotidiano, a menos que você trabalhe diretamente com tais institutos. Passemos a discutir sobre tais tema de modo que se tornem mais agradáveis e entendíveis.

 

Colação significa o dever do herdeiro de trazer à conferência os bens recebidos por doação para possibilitar uma divisão igualitária da herança. O fundamento da obrigação de trazer à colação reside no princípio da igualdade e da intangibilidade das legítimas.

 

Essa obrigação não é imposta a todos que foram beneficiados com uma doação, nem a todos os herdeiros necessários, é uma obrigação específica dos descendentes, quando existirem outros herdeiros da mesma classe na sucessão.

 

Art. 2.002. Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação.

 

Também é uma obrigação imposta ao cônjuge ou ao companheiro sobrevivente, desde que tenham direito de concorrência sucessória (a depender do regime de bens) com os descendentes ou ascendentes do falecido, vejamos:

Art. 2.003. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida neste Código, as legítimas dos descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo do falecimento do doador, já não possuírem os bens doados.

 

Portanto, os bens doados em vida pelo de cujus ao cônjuge ou companheiro sobrevivente, que possuem direito de concorrência sucessória, [1] devem ser trazidos à colação.

 

Toda pessoa pode doar o que quiser a quem quiser, só não pode doar seu patrimônio de modo que fique sem ter como prover o sustento próprio, assim dispõe o Código Civil:

 

Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador.

 

O indivíduo também não pode doar mais da metade do seu patrimônio se tiver herdeiros necessários, sendo que tal restrição é a base da sucessão legítima, ou seja, assegurar aos herdeiros necessários a metade da herança[2], chamada de legítima. os seguintes artigo confirmam tal

 

Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

 

Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

 

Se o titular do patrimônio possui herdeiros necessários ele só pode doar metade do seu patrimônio, ou seja, deve ser respeitado a legítima, que é a metade do patrimônio do titular que deve ser destinado aos herdeiros necessários.

 

Portanto, se a doação invadir a legítima, quanto ao montante ultrapassado, chamado de excesso, a doação será nula e será chamada de doação inoficiosa.  A consequência da doação inoficiosa é a nulidade da parte excedente do limite legal e não nulidade total da doação.

 

Dessa forma, quando o artigo 549 do Código Civil Brasileiro estabelece [3]a nulidade da doação quanto à parte excedente à legitima, significa que somente o excesso da doação que atingiu a legítima é que será considerado uma doação inoficiosa e esse excesso deverá retornar ao herdeiro necessário, legítimo titular.

 

Conforme preceitua o artigo 544 da Lei 10.406/200, a lei presume que toda doação feita de ascendente a descendente é considerada um Adiantamento de legítima. Isso significa que a doação feita é retirada da parte indisponível do patrimônio do doador, ou seja, da legítima, e, por isso, é chamada de adiantamento de legítima.

 

Portanto, as doações feitas a herdeiros necessário são retiradas da legítima e não do patrimônio disponível do doador, salvo quando, de modo expresso, o doador especificar que a doação ao herdeiro necessário saiu da parte disponível[4]. De outro modo, as doações feitas a quaisquer outras pessoas, que não sejam herdeiras necessárias, saem da parte disponível do patrimônio do doador.

 

O herdeiro necessário que se recusar a trazer à colação os bens recebidos por doação será chamado de sonegador, configurando-se a chamada sonegação. A pena imposta a quem se omite de trazer os bens à colação é a de perder os bens que recebeu.[5]

 

Vale ressaltar que o adiantamento de legítima é feito por meio de doação (ato formal, solene), por ato inter vivos, havendo incidência de imposto de Transmissão Causa mortis e doação (ITCMD).

 

Portanto, podemos concluir que doações feitas a favor dos herdeiros necessários não são proibidas, mas possuem peculiaridades. Como foi visto aqui, os herdeiros necessários, em especial os descendentes e o cônjuge ou companheiro que possuem direito de concorrência sucessória, que receberam doações, quando da abertura do inventário do falecido, precisam trazer os bens recebidos por doação à colação, ou seja, precisam declarar os bens recebidos, de modo a verificar se o doador ultrapassou ou não o limite legal de doação, sob pena de perder o bem doado e incorrer em sonegação.

 

Além disso, as doações feitas a herdeiros necessários sempre importarão em adiantamento de legítima, salvo se expressamente o doador estipular que o bem doado está sendo retirado da parte disponível, e o adiantamento de legítima é feito por meio de doação, com incidência do ITCMD.

 

Por fim, se a doação ultrapassar a legitima dos herdeiros necessários, será chamada de doação inoficiosa e quanto ao excesso da doação haverá anulação.

 


 

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.

 

[2] Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima[2]

 

[3] Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

 

[4] Art. 2.005. São dispensadas da colação as doações que o doador determinar saiam da parte disponível, contanto que não a excedam, computado o seu valor ao tempo da doação.

 

[5] Art.1.992. O herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia.

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