Tributação em Streaming e o Conflito de Competência

Bárbara Maia Simões

Acadêmica de Direito.

 

As inovações da Quarta Revolução Industrial têm sido caracterizadas pela introdução ao mercado de tecnologias antes nunca utilizadas. Assim, o século XXVI encontra-se demarcado por plataformas de software inovadoras, robôs e, ainda, aplicativos de streaming, reproduzindo músicas e filmes de formas antes nunca vista.

Dessa forma, o Direito tenta acompanhar os novos costumes suscitados pela era da inovação, passando a questionar e enquadrar hipóteses de litígio que podem vir a ser suscitada.

Assim, o legislador em sua tentativa de acompanhar essas inovações, passa buscar meios para enquadrar o Streaming nos tributos já dispostos na Constituição Federal e Código Tributário Nacional, mais especificamente ao Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN) e Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Preliminarmente, é necessário compreender qual o conceito do objeto em análise, visto que é a partir disso que poderá ocorrer a aplicação da regra matriz-incidência dos impostos ISSQN, ICMS ou, ainda, a inviabilidade de cobrança por estes meios.

O significado de streaming não está previsto, de forma específica, na legislação brasileira, impossibilitando que haja a aplicação do conceito jurídico. Posto isto, parafraseando a Universidade de São Paulo, esse conceito pode ser ramificado de duas formas:

  1. Broadcast: Transmitidos em plataformas de forma simultânea, sendo, em geral, a transmissão de programas em rádio, televisão ou em plataformas como o YouTube;
  2. On demand: Sendo a tradução literal “sob demanda”, significa que o usuário terá na memória de seu dispositivo armazenado áudio e vídeo para posterior utilização, sem um download definitivo do conteúdo;

Portanto, streaming on demand, especificamente, consiste em fornecimento de multimídia, permitindo que o usuário realize o carregamento de arquivos de forma simultânea ao conteúdo que está sendo consumido. Assim, corresponde a uma plataforma online, sem o armazenamento permanente de dados como em download.

Ademais, é possível que essa prestação seja ofertada de forma gratuita ou paga, a depender de cada plataforma. Os vídeos repassados no YouTube, por exemplo, são de forma gratuita, estando a mercê do usuário usufruir de outros benefícios ao assinar o pacote pago.

Em relação as prestações pagas, por exemplo, são citadas a Netflix e Spotify, as quais demandam de um pagamento mensal e periódico para que o usuário possa usufruir do conteúdo disposto, ainda que sem a cessão definitiva.

Ademais, essa plataforma difere-se, ainda, da comercialização de software, o qual necessita que o produto seja baixado para ser usufruído pelo consumidor. Trata-se de um licenciamento do direito de uso de um produto intelectual, caracterizando uma cessão de direitos e não uma titularidade de destes.

Posto isto, a normativa brasileira passa a tentar enquadrar o streaming como uma disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, nos próprios termos da Lei Complementar 116, item 1.09, Lei do ISSQN.

Apesar disso, a problemática não se encerra nesse momento, já que os estados, em sua tentativa de arrecadar também para seus cofres algum capital, o Convênio de ICMS 106/2017 do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) dispõe que pode haver o recolhimento do respectivo imposto nas importações efetuadas por intermédio de site ou plataforma eletrônica que disponha de venda ou disponibilização de bens e mercadorias digitais.

Outrossim, é claro o empenho da figura legislativa para enquadrar essa plataforma digital dentre dos tributos acima mencionados. De todo modo, apesar da inserção positivada desses conceitos, derivados do significado do próprio termo, não se torna conclusivo sobre a hipótese de tributar esse objeto.

Apesar das afirmações previamente realizadas, o Convênio de ICMS 106/2017, instituído pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), abasteceu a LC87/96 de forma a viabilizar a regulamentação pelos Estados de tributação em ICMS que tenha âmbito na transferência eletrônica de bens digitais.

Esse convênio previu a incidência de ICMS sobre a comercialização da transferência de dados por meio da internet, softwares, jogos, aplicativos e, ainda, arquivos eletrônicos.

Ademais, fixou a figura do contribuinte, determinando que o detentor do site ou plataforma eletrônica deve possuir as inscrições estaduais devidas, isto é, em todos os Estados do país que estiver produzindo seu serviço. Assim, o local de recolhimento do imposto é em toda unidade federativa em que é estabelecido ou domiciliado do adquirente do bem ou mercadoria digital.

Nessa toada, os Estados passaram a editar normas condizentes a consulta repassada pelo CONFAZ, permitindo, dentro de suas competências, normas que possam promover viabilidade a normativa. Nesse sentido, o Estado de São Paulo editou o Decreto 63.099/2017.

A partir disso, iniciou a discussão sobre um conflito de competência e, assim, uma possibilidade incidência de dupla tributação, entre ICMS e ISSQN, sobre um mesmo fato gerador: o streaming.

A controvérsia tornou-se palco para indecisões em razão da promulgação da Lei 157/2016, posteriormente analisada em tópico devido, a qual inseriu como viável a cobrança de ISSQN em disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet.

Por conseguinte, a inserção do subitem 1.09 é clara ao definir que não deverá haver cessão definitiva de conteúdo de áudio e vídeo, de mesmo modo que o Convênio do Confaz é sólido de que a incidência do ICMS irá se confurar na comercialização de jogos e software, aplicativos e arquivos eletrônicos, desde que padronizados. Isto é, torna-se imprescindível a transferência de titularidade dos objetos, inserindo na categoria de mercadoria.

Ademais, em relação ao “S” pertencente ao ICMS, em sua comunicação, não detém força o suficiente, por si só, para atrair a incidência do imposto.

Posto isso, analisa-se a partir desse momento, de forma breve, sobre a inserção do item 1.09, por intermédio da Lei Complementar 157/16 (LC 157/16), na lista anexa de serviços, a qual fomentou a discussão e conflito de competência da tributação do streaming.

O tópico preceituado afirma que a prestação de serviço, mediante cessão sem ser definitiva de conteúdo de áudio, vídeo, imagem ou texto por meios digitais são passíveis de incidência do ISSQN.

Por meio dessa perspectiva, os serviços de streaming são, em seu amago, uma obrigação de fazer. Isso ocorre, preliminarmente, porque não há uma transferência de propriedade de forma definitiva, conjectura basilar para a previsão de ICMS.

Os usuários dessas plataformas prestam uma remuneração mensal para acessar e, por consequência, a empresa deverá propiciara disponibilização do objeto do contrato, mediante uma sublicença do direito de uso, sem a cessão definitiva, tangenciando, assim, a obrigação de fazer pela internet.

Nessa toada, o Estado de São Paulo aprovou o projeto de lei para que ocorra a incidência de ISSQN na cobrança de streaming em seu território. Dessa forma, em novembro de 2017, passou a constar na Lei 13.701/03, art. 1, o item 1.09, suscitado pela LC 157/16.

Assim, a normativa do Estado paulistano passa a cobrar uma alíquota de 2,9% do, então, serviço de streaming de forma ampla, sendo o pagamento do imposto no local em que se última a prestação.

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